Quatro desconhecidos no Beco Diagonal

Helga encontrara Salazar na porta do Beco Diagonal. Tinham trombado um no outro, os dois com uma pressa absurda de fugir. Quando se encararam - por um segundo, porque logo Helga, bruxa educada, retirou o olhar - pareciam saber que se conheciam há séculos e séculos.

Salazar sentiu seu estômago queimando, algo que nunca tinha lhe ocorrido antes. Estava sozinho, estava em Londres sem dinheiro e sem conhecer ninguém - estava ferrado! Vendo que a garota loira (pés cobertos, então tinha alguma coisa - rosto redondo, então nunca passara fome) continuava caminhando perto dele, virou-se e perguntou:

 

- Para onde você vai?

 

A garota lhe encarou rapidamente e disse, com um fio de voz, que não tinha destino certo. Salazar balançou a cabeça, desapontado.

 

- Eu muito menos. Sou Slytherin, Salazar Slytherin. Você tem um nome?

- Helga.

- Você tem um sotaque estranho. De onde vem?

- Swamsea.

- Eu sou de Dublin. Dois estrangeiros, vão nos trucidar aqui. Eu deveria saber, claro, mas que chance que eu tinha? 

- Como assim?

- Ah, lhe conto depois. Você está sozinha?

- Estou.

- Então fique junto de mim. Juntos, eles não podem nos bater.

 

Helga olhou para ele com pânico. Tinha viajado de pó de flu por horas, estava com fome e zonza, não conhecia nada nem ninguém e agora tinha aquele sujeito magrelo e com barba por fazer, lhe fazendo perguntas com um tom ameaçador. Por sorte, ele parou de falar quando viu dois bruxos caminhando na direção contrária a eles - um rapaz vestido de vermelho, como um nobre, e uma garota de pés descalços e rosto altivo, erguido para a frente. Salazar olhou admirado para o casal e comentou com Helga.

 

- Olha que estranho, eles estão andando lado a lado! Que engraçado!

- Não entendo.

- Aqui as mulheres andam atrás dos homens na rua. Como era na sua terra?

- Na minha terra as mulheres não andavam na rua.

- Ah, é por isso que você está com essa cara de perdida!

 

Helga ficou vermelha como um tomate, olhando desesperadamente para o chão cmoo se procurasse alguma coisa para se salvar. Salazar deu uma gargalhada e, já se sentindo em casa, foi na direção daquele casal tão estranho. Parou na frente do rapaz de vermelho e lhe perguntou:

 

- A garota não devia estar atrás de você?

- Não - o outro lhe respondeu.

- Porque esse é o costume, você sabe.

- Talvez na sua terra seja. Aqui não vejo motivo para ela andar atrás de mim.

 

Salazar encarou o rapaz - tinha a sua idade, se não um pouco menos - e parecia compreender que ele não queria brigar. Os dois nunca tinham se visto antes e pareciam se entender. Salazar encostou a mão no estômago - era aquela dor esquisita de novo. Não era fome, não era medo, o que poderia ser, então?

Para distrair-se, ele virou para Helga, que estava parada ainda no mesmo lugar de antes.

 

- Helga! Venha para cá ou vamos nos perder! - Salazar virou-se para o garoto - Estamos perdidos, os dois. Ela é do fim do mundo da ilha e eu sou da Irlanda. Nunca viemos para cá antes.

- Nem nós - respondeu a garota de pés descalços, olhando para Salazar pela primeira vez.

- Perfeito, quatro estranhos no Beco Diagonal...escutem, vamos ser massacrados se ficarmos aqui. Não tem para onde ir? Nem nós dois. Que tal se ficarmos juntos?

- Juntos?

- Difícil alguém tentar alguma coisa quando se está em um grupo grande, ao menos é o que eu acho. Falando nisso, sou Salazar, e a loira aqui é a Helga, e vocês dois?

- Godric, e ela é Rowena.

 

Rowena estendeu os olhos para Helga, que parou de olhar para o chão. Pareciam se entender - duas bruxas sem terra nem nome. Godric olhou em volta e para o alto.

 

- Vai anoitecer. Precisamos arranjar um lugar para passar a noite.

- Creio que isso pode ser arranjado, meus caros - disse uma voz logo atrás de Salazar.

 

Todos se voltaram para ver de quem se tratava. Era um sujeito muito alto, com uma capa que lhe cobria o corpo e a cabeça. Sua barba era tão grande que lhe passava do cinto em direção aos joelhos. Tinha uma mão coberta em uma luva e a outra, pálida como uma nuvem, tinha dois anéis em cada dedo. Ele segurava um cajado e parecia ter aparecido do nada, pois qualquer um teria notado a presença daquele ser esquisito no meio do Beco Diagonal.

Rowena, quando viu o homem, imediatamente se ajoelhou diante dele com um olhar de pânico. Os outros olharam sem entender, até que ela lhes disse, em um sussurro:

 

- Com mil diabos, dobrem o joelho. Sabe quem é este homem?

- Não faço a mínima idéia e não me ajoelho para ninguém! - respondeu Salazar. Rowena lhe puxou a barra da capa e ele desabou ao chão, dando com a testa no chão.

- Silêncio. Ele é Taliesin, Merlin da Bretanha. Esse nome lhe diz algo?

 

Imediatamente Salazar - a testa sangrando- ergueu os olhos para o homem, morto de medo, enquanto Godric e Helga também se curvavam. Estavam na frente do mais poderoso bruxo do mundo, e ele estava falando com eles como se ele tivesse visto-os nascer. Era uma honra que nunca tinha sido concedida a eles e era algo que ninguém, nunca, estaria esperando encontrar. 

 

- Levantem-se, vocês não tem porque se curvarem - Merlin disse, a voz pesada de um homem que já vivera muito e ainda viveria por muito tempo - Vocês finalmente se encontraram. Isso é bom. Já não sabia por quanto tempo eu conseguiria esperar por seu retorno.

- Como, senhor? - Helga perguntou, sem entender nada.

- Vocês saberão, em tempo. Venham, está mesmo anoitecendo e vocês não podem passar a noite na rua. Eu tenho um lugar aonde vocês podem ficar.

 

Os quatro se ergueram e, sem dizer uma palavra, saíram caminhando atrás de Taliesin. Estava ficando cada vez mais frio e cada vez mais escuro no Beco Diagonal, e na hora em que eles finalmente pararam em frente a uma casa, já não existia uma viva alma na rua.

 

Continua a qualquer momento...

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